Audiência
Toim, toim, toim, toim, foi o som do scarpin
ouvido pelo tribunal, às 8h59, pois às 9h começaria a audiência. Sobre eles
via-se uma mulher jovem, com cerca de 30 anos de idade, alta, de porte
atlético, a quem o queixo levemente levantado e um tubinho preto dava certa
aura de imponência. Os cabelos longos e ondulados
ajudavam a sensualizar e suavizar a seriedade que emanava de seu ser.
Ao vê-la, a juíza não soube dizer se se
tratava de seu natural, ou um preparo especifico pra ocasião. Se havia ali a
intenção de mostrar-se bem, por cima, bela, sedutora, confiante. Já visualizará
isso muitas vezes, e surpreendera-se ao não saber dizer se se tratava de uma
coisa ou de outra. Há pessoas em que a imponência é natural, pois esse é seu
temperamento, seu traço de caráter, seu signo principal e o que compõe todas as
demais casas do seu mapa astral.
A audiência começara e encaminhava-se ao tão
rapidamente que mais parecia um piscar de olhos. Tendo ajudado pra isso o silêncio
da acusada, que confiou que o que seu advogado diria e mostraria, já era mais que suficiente
para resolver a situação. Falara muito durante o envolvimento que teve com o
acusador, e do que adiantara? Quem não quer ouvir jamais ouvirá. Na época ela
não sabia disso, mas ele a ensinou.
Logo, lhe veio o veredito: compreendo que
a senhora tenha apenas respondido as mensagens enviadas anteriormente pelo
acusador, mas o quantitativo e frequência das respostas deram, de fato, margem para que fossem
entendidas como vindas de um perseguidor. Logo, levando em
consideração o incômodo causado, e não o crime, pois esse jamais existiu no
caso em questão, a sentencio a doar uma cesta básica.
Assim que a juíza levantou o martelo, a
acusada levantou a mão. O guarda mais próximo se aproximou dela. Ela Sussurrou-lhe ao
ouvido. Ele ao da juíza.
- A senhora tem autorização para se
aproximar do tribunal, disse a meretissima.
Aproximou-se e falou em um tom que só a
juíza foi capaz de ouvir. Que bela e suave voz. Desmentia a imponência ou a
confirmava? Afinal, cobras ciciam, pensava a juíza. A acusada calou-se. Ouvia a resposta.
Respondeu com um meneio de cabeça e um quase imperceptível sorriso. Tornou ao
seu lugar. E novamente a juíza falou:
- Compreendo que a senhora tenha apenas respondido as mensagens enviadas anteriormente pelos acusadores, mas a frequência das respostas deu, de fato, margem para que fossem entendidas como vindas de alguém disposto a perseguir. Logo, levando em consideração o incomodo causado, e não havendo crime algum, a sentencio a doar duas cestas básicas. Dou por encerrada a audiência.
Todos levantaram e logo o tribunal pode
ouvir novamente: tuim, tuim, tuim, tuim, vindo do salto da mulher jovem, com
cerca de 30 anos de idade, alta, de porte atlético, a quem o queixo levemente levantado e um tubinho preto
dava certa aura de imponência. Direcionava-se ao homem que a acusou de
perseguição. O homem com quem teve um caso por seis anos. E que ao lado, e aos
olhos da esposa, parecia um santo.
Olhou para ele tão somente porque era preciso mira-lo bem para que o que tencionava fazer fosse preciso, como olham pra mira da arma aqueles que pretendem atingir o alvo. Ouviu-se então um “plaft”. E, viu-se um rosto muito pálido marcado por cinco longos dedos.
Ele imediatamente levou a mão ao rosto.
Olharam, marido e mulher, à juíza como quem busca uma intervenção. Ela levantou
dois dedos e em seus lábios leu-se: duas cestas básicas.
Toim, toim, toim, toim, ouvia-se ao longe,
talvez nem no corredor estivesse mais.
Sim, é o seu natural, pensou a juíza. E
lamentou que não fossem assim todos os réus.
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